sexta-feira, 5 de abril de 2013

John Fante: os sonhos devastados e reconstruídos

Marlon Villas

John.
(Fonte: mail-attachment.googleusercontent.com)

Até poucos dias atrás eu não tinha tido a oportunidade de pegar um livro de John Fante em minhas mãos. Muito ouvi falar dele, de que era um escritor marginal ou coisa parecida, que não se importava em ter um estilo rebuscado como outros famosos escritores de sua época (aliás, estilo rebuscado seria algo que não faria o menor sentido em seus escritos) etc. Muitos outros escritores admiram ou admiraram sua obra. Um deles foi Charles Bukowski, de quem você já me viu falando aqui pelo menos duas vezes. Outro é Marcelo Mirisola, um paulistano da geração 90 de novos escritores brasileiros, irônico, crítico ao extremo e escatológico por excelência, com diversos livros lançados por diferentes editoras (quem sabe eu fale mais sobre ele num outro momento).

A primeira vez que descobri o nome de Fante foi quando avistei um pôster do filme Pergunte Ao Pó em uma locadora de vídeos anos atrás. Demorou mais um tempo para que eu assistisse à obra, protagonizado por Colin Farrell e Salma Hayek. A história me pareceu um pouco estranha, talvez porque eu não estivesse preparado para o que iria presenciar na tela da minha televisão. Depois fui entendendo melhor o enredo e, por fim, achei bem interessante.

Logo após isso esqueci John. Não me lembrava de procurar saber mais sobre o autor de Pergunte Ao Pó, livro que deu origem ao filme, com tantas outras coisas acontecendo, como por exemplo o fato de que eu tentava sair vivo, pelo menos respirando, da universidade onde me enfiei, ou então de arranjar um trabalho razoável com um diploma de nível superior debaixo do braço.

Até que outro dia entrei em uma livraria que não possuía um acervo muito grande de livros, e encontrei uma dessas edições de bolso de Sonhos de Bunker Hill, da editora LP&M.  Sonhos... é o último romance de Fante antes de sua morte, e que foi ditado à sua esposa pois o escritor estava cego e aleijado ao final de sua vida, por conta do diabetes do qual sofreu por anos até 1983, quando faleceu. Claro, soube disso apenas porque estava na contracapa. Eu ainda me perguntava: quem diabos é John Fante?

Capa da edição.
(Fonte: mail-attachment.googleusercontent.com)
Da mesma forma que em Pergunte Ao Pó, em Sonhos de Bunker Hill John usou mais uma vez seu personagem (e espécie de alter ego) Arturo Bandini como protagonista, um típico, clássico anti-herói, um sujeito meio ressentido que, entre empregos mal pagos, tenta se tornar um escritor de renome após o que sobrou da América com a grande crise de 1929. Neste livro ele chega perto da fama, quando consegue um lugar ao sol entre os roteiristas de Hollywood da década de 1930. Porém, por mais que desejasse escrever algo, qualquer coisa para se sentir útil, o seu chefe sempre diz que é para ele esperar o momento certo, e que “está fazendo um bom trabalho”. Mesmo sem atividade, Bandini ganha cheques polpudos um atrás do outro.

O aspirante a escritor ainda se mete em confusão com uma mulher, também escritora e rica, quando praticamente a ataca na praia durante o que deveria ser uma tarde relaxante para os dois. Envolve-se com a sua senhoria do prédio onde mora, uma mulher bem mais velha que ele, que no início julgava ser uma pessoa ruim, e que termina por gostar bastante dela.  Recusa-se a ter seu nome creditado a um roteiro de faroeste por princípios morais, roteiro este que foi totalmente modificado por outra escritora, e que havia sido o único que ele tinha escrito durante toda a sua estada em Hollywood. Arturo também dá a impressão, às vezes, de ser um tipo que, embora reclame de muita coisa e de muita gente, não possui uma certa coragem para enfrentamentos, pois em pelo menos duas ocasiões deixa bilhetes com palavras duras a pessoas que o aborreceram ou o decepcionaram. Como no caso em que, num jantar em um restaurante com um amigo, encontra o escritor Sinclair Lewis (pessoa real, o primeiro norte-americano laureado com o prêmio Nobel de Literatura, transformado aqui em personagem) e este o despreza publicamente. Enfim, um homem que busca um lugar no mundo e que ainda busca descobrir que lugar é esse.

Sonhos de Bunker Hill é um livro fácil e rápido de ser lido, e que me fez ter vontade de conhecer mais John Fante pela riqueza e simplicidade de suas palavras. Um escritor que não se preocupava em trabalhar e expor emoções, que abria feridas morais e sentimentais, sem regalias. É isso, sem dúvidas, o que John foi.

Título: Sonhos de Bunker Hill (original: Dreams of Bunker Hill)
Autor: John Fante
Editora: LP&M
Número de páginas: 166

Nenhum comentário:

Postar um comentário