segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Um clube, um filme, o retrato de uma crise

Marlon Villas

Muito bem, vou falar de algo que provavelmente vai soar mais familiar para quem viveu de verdade os anos 80 e o início dos 90 quando criança ou adolescente, tudo bem?

Todo mundo aqui no Brasil sabe que a programação da Rede Globo não é, nem de longe, apreciada no quesito qualidade-realidade. Assistimos a alguns programas (raríssimos, que surgem de vez em quando) que retratam de certa forma (veja bem, eu usei a expressão "de certa forma") a realidade desse país adentro, como a série Carga Pesada, ou que nos fazem sentir como se estivéssemos vendo nossos vizinhos e conhecidos, como a série A Grande Família. Mas isso infelizmente, como já frisado antes, não é o que acontece na maioria das vezes. É aquele tipo de programação que foge totalmente ao senso de cotidiano para nós, mas que garante bastante audiência entre a massa de telespectadores.

Nem vou falar das novelas, que há anos não acompanho sequer uma, e que demonstram falta crônica de credibilidade, para mim, embora eu conheça muita gente que as admire, inclusive meus pais, que ficam doentes se perdem um capítulo de qualquer uma delas.

O clube dos cinco de castigo.
(Fonte: http://2.bp.blogspot.com/)
O que desejo externar aqui é a falta que faz, nesta mesma emissora televisiva, bem como em outras,  programações e filmes que sirvam de parâmetro de identidade para os jovens. E nem venha comentar a respeito sobre a pseudo-novela Malhação, porque qualquer comparação do que apresentam ali com a realidade da juventude brasileira é um tremendo desrespeito com as novas gerações.

Nos anos 80, e até o começo dos 90, nós, crianças, pré-adolescentes e adolescentes, tínhamos algo que nos fazia sentar a bunda no sofá durante as tardes e ligar a tevê na Globo para nos vermos refletidos na tela, mesmo que o que acontecesse nos enredos fosse a milhares de quilômetros de distância de nossas casas: os filmes daquela época, várias vezes reprisados ano após ano, contando peripécias, anedotas e dramas juvenis pelos quais todo garoto ou garota passa nesse período da vida.

Lembro vários filmes sensacionais daquela época, como (os títulos são os lançados aqui) Fica Comigo, Curtindo a Vida Adoidado, Te Pego Lá Fora, Goonies, Mulher Nota Mil e tantos outros, a lista é gigantesca. Há outros que falam sobre situações diversas, porém vou me focar nos juvenis. Sendo assim, queria falar de um filme em especial, e de um diretor em especial.

A mente brilhante atrás das câmeras.
(Fonte: http://i102.photobucket.com/)
John Hughes. Não acho que até hoje tenha existido um diretor de cinema com tanto tato e sensibilidade para expressar o que um adolescente passa em seus desejos e angústias, não importa de qual geração seja, do que esse sujeito. Recentemente ele faleceu e acabou sendo feito um documentário sobre sua carreira, que é tão interessante quanto seus filmes - e trata justamente dessa influência sobre os jovens daqueles anos. Estou falando de Don't You Forget About Me. Não faz muito tempo, escrevi uma impressão sobre este trabalho em meu blogue pessoal, que você pode ler aqui.

E um dos trabalhos de Hughes, que foi um marco para todos os moleques dos anos 80, sem dúvida foi O Clube Dos Cinco, embora eu não me recorde de ter assistido a este pela tevê, talvez porque fosse o tipo de película que a censura, na época, não deixaria passar, por conter cenas consideradas pesadas para o tipo de público-alvo - há pelo menos um momento em que os protagonistas mostram claramente fazer uso de maconha.

Cinco estudantes de uma escola são obrigados a cumprir um castigo, que seria passar um dia de sábado juntos, pois o diretor esperava que cada um escrevesse uma redação sobre o que pensa de si próprio, como uma maneira de refletirem sobre o que tinham cometido de errado em seus comportamentos. A ideia inicial, como você pode notar, é extremamente simples, mas era assim que Hughes gostava de experimentar nos seus filmes, os enredos, em geral, eram simplórios, mas o seu grande trunfo era trabalhar as emoções das personagens.

Um atleta, um nerd, uma patricinha popular, uma garota esquisita e antissocial e um delinquente. Estes são os cinco protagonistas, além do diretor e do faxineiro da escola, que seriam coadjuvantes no roteiro. Nenhum dos alunos antes se conhecia, e é claro que se estranham nos primeiros momentos. Depois começam a se envolver mais e compartilhar seus problemas com relação a outras pessoas, principalmente os atritos que sofrem com seus respectivos pais. O diretor é um típico funcionário arrogante que despreza, humilha e provoca todos no castigo, enquanto o faxineiro é mais "liberal" e "compreensivo" com os garotos.

Impossível não se identificar com seus dramas, pelo menos de um ou outro ali em punição, a menos que você seja um tipo insensível que já nasceu adulto e preocupado somente com suas contas a pagar. Quem jamais passou pelas angústias de aceitação, de aprovação, de rejeição, de insegurança, de desespero quando adolescente, então que jogue a porcaria da primeira pedra.
Compartilhando alegrias e dramas.
(Fonte: http://1.bp.blogspot.com/)

Dois dos atores, Molly Ringwald (a estrela dos filmes de John Hughes) e Emilio Estevez (o irmão de Charlie Sheen, o Charlie Harper da sitcom Two And A Half Men, e filho do ator Martin Sheen) são os mais famosos atualmente. Mas na minha mera opinião, quem rouba a atenção em todas as cenas que aparece é o rebelde, interpretado por Judd Nelson, que hoje não tem muita expressão nos meios de Hollywood. Nelson conseguiu dar vida a sua personagem de tal forma que você pode sentir simpatia e antipatia por ele, ao mesmo tempo.

Sinceramente, penso que as novas gerações, pós-anos 80, não são representadas do modo como deveriam. Não consigo perceber as mesmas emoções juvenis tão claramente como em O Clube Dos Cinco nos filmes de hoje. Inclusive isso é mostrado de fato nos depoimentos de garotos entrevistados no documentário Don't You Forget..., já mencionado. Não há comprometimento de verdade com o retrato do imenso turbilhão da adolescência, como todos nós sabemos como é (ô insensível, melhor você ir embora daqui). Por favor, cineastas, acordem pra cuspir.


Titulo: O Clube Dos Cinco (Brasil) / The Breakfast Club (original)
Lançamento: 1985
Direção: John Hughes
Duração: 93 minutos

3 comentários:

  1. Preciso rever este. Faz um tempão que não assisto.

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  2. Quando eu era pré-adolescente, eu assistia muito o 'Confissões de adolescente' e o 'Anos incríveis'. Me identificava muito com ambos (ainda que o primeiro falasse mais da rotina de garotas adolescentes).
    Mas anos incríveis ainda é o meu favorito, até mesmo porque pude ter a visão de duas fases da vida: ontem da adolescência, hoje dos adultos. É emocionante assistir esse seriado e ver que ainda me emociono com ele, seja pelo turbilhão adolescente, seja pelos dramas da vida adulta - ou o drama da passagem para a vida adulta.
    Post muito legal, Marlon. Realmente, acho que essa geração não tem uma visão que realmente a represente. A geração 'Crepúsculo' ainda tem muito por ter que ser representada.

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